sábado

Intensidade.

Querido,
E aquele agora ou nunca ficou pra trás.
É bom arrancar as páginas do calendário. Janeiro, fevereiro, março, o tempo passa e demorou, mas agosto chegou. Estamos em dezembro, Natal foi ontem, e daqui quatro dias... acabou. Tantos desencontros em nossas vidas este ano, não é? Não procuramos simetria alguma. As coisas não deram muito certo, mas as roseiras cresceram, a nossa casa é tão amarela, de esperança, se lembra? Não sei se posso te perguntar sobre as lembranças. Você tem esquecido de tudo e é tão frequente. Mas se paro e penso, vejo que você não se esqueceu, as coisas simplesmente não aconteceram e eu fantasiei. Não existe casa amarela, não existem roseiras. Eu li tudo isso numa história um dia. Eu continuo a contar nossa história, meu caro, para quem quiser ouvir. Ontem, eu estava sentada num banco da praça esperando alguma hora chegar, de longe vi uma menina apressada, como se olhasse no relógio as horas e seguia um coelho. Seu país das maravilhas me enguliu. Tudo era tão mágico, e ainda Natal. Tudo era tão belo. Eu tive que voltar. Entrei para casa, tomei um chá, o telefone toca, mas não é você. O telefone toca, mas não é para mim. O telefone toca e eu não atendo. Barulho de telefone me causa desconforto, mas rapidamente parou de tocar. Quem quer que havia ligado, desistiu rápido demais. Eu disse que não era você, mas não tenho certeza. Talvez eu nem estava lá. Tudo isso está ficando confuso demais para você? Desculpa, eu sou sempre assim, quero descrever tudo e depois não tenho certeza se era verdade ou mentira. Eu crio muito, invento muito. Sentei na cama e comecei a desenhar. Desenhei uma árvore, a única coisa que veio em minha cabeça. Só consegui desenhar uma árvore, todo o resto parecia inexistente, impossível de ser desenhado. Então chorei, porque detesto me ver impedida de fazer algo, por isso choro tanto quando penso nas medidas do meu amor por você. Mas acho que nem chorar choro mais. O ano está acabando. As pessoas chamam de ano novo o próximo que virá. Eu prefiro acreditar que, no ano que se aproxima, eu esteja renovada e então, enfim, livre de você e de todas as correntes imaginárias que nos unem. Acho que gostar assim de você se deve justamente a impossibilidade, ao impedimento deste sentimento. Mas as coisas estão mudando. Minhas palavras estão ficando pobres, temo que esta seja nossa última carta. Ú-l-t-i-m-a, talvez por isso deveria ser rica de palavras e deveria te arrancar lágrimas assim que você terminar de ler. Entretanto, não consigo nada melhor que isso. Como quando desenhei a árvore. Não consigo ultrapassar esse ponto. Me desculpa, mas assim que o ano acabar, eu terei de partir. Talvez para o reino das maravilhas com a menina apressada e seu coelho, talvez para qualquer outro lugar. Mas quando eu voltar, como naquela música, vou te dizer que as opções ainda estão aqui, só que isso demora, isso vai demorar, e te peço para que não me espere. Permita-se, apenas.
Não pule ondas, não coma uvas, nem passe a virada do ano com uma peça íntima vermelha para atrair o amor. Superstições não funcionam não. E o amor só se sente atraído no momento certo.
Feliz próximo ano, feliz pessoa nova que você, se quiser, irá se tornar. Por favor, se quiser esquecer, esqueça, mas eu te amo muito, e ainda daquela forma pura, que nada em troca pede.
Um abraço apertado, com cheiro de alecrim e fogos de artifício no seu céu, meu céu!
Com carinho e lágrimas, da quase nova,
Maria.

PS: termino o ano sem querer voltar atrás em nada. E você? Tem feito as escolhas certas?