terça-feira

Ad infinitum

Querido,
Nos outros eu sei onde se abriga o coração, é no peito; em mim a anatomia ficou toda louca, eu sou todo coração.
Não consigo escrever mais carta alguma, querido. Trecho, verso, prosa, nada. Não sai nada, palavra nenhuma. Tenho medo de ter me tornado... não encontro a palavra certa. Mas é como se as palavras certas não existissem mais, porque não as encontro nunca. Nem em ruas desertas ou becos sem saída. Nada. E olho que procuro, hein?! Escrevo, apago. Parece tudo borrado, milhões-de-frases-sem-nenhuma-cor, será que você pode entender? Eu não te encontro também. Ou te encontro e não te vejo. Ou te vejo e nem sinto mais o que eu pensava sentir por você. Pois é, as coisas mudam e as pessoas - veja - as pessoas mudam ainda mais. Ou não mudam nada. Desde que voltei, encontrei muita gente que parece como quando eu saí: iguais. Congeladas num tempo que nunca mais passou. Numa página de calendário que nunca mais virou. Ontem foi meu aniversário, sabia? A paz me invadiu por completo. É claro que é mais uma data, um número a mais nos cálculos da vida, mas que me inundou de paz. Paz de palavras que chegaram por pessoas certas, pelos meios certos. Não haveria como ser melhor, acho que quebraria todo o encanto. Eu tenho feito descobertas: já não sei mais onde fica o meu coração. Tudo está exposto, como uma ferida aberta que não cicatriza, mas se alastra por todo o resto do corpo, por todos os poros. Essa minha mania de amor, mania de amar, mesmo sabendo sofrer, mesmo sabendo o peso que tem o amor nas costas humanas. Não tenho culpa, amo cada vírgula desse texto pobre - porque me perdi das palavras - amo porque só isso sei fazer. E é isso. A anatomia se confundiu, as nuvens encobriram o céu. Acho que vai chover...
M.

Um comentário:

Patrícia Camila disse...

que lindo, Maria :) como eu sei que você escreve você então... Muitas vezes as palavras parece que correm do papel, da tela, do teclado; teimosia. Mas sabe... devemos obrigá-las a ficar ali, nem que formem uma frase indecente, um texto banal ou uma história morta. Seja violenta com o papel, às vezes é isso que as palavras querem, depois elas voltam a ficar de bem. Quanto ao coração, eu acho que o seu está no lugar certo, acho. te amo muito, beijos.
(e mesmo com tudo que contas, teus textos continuam a ser deslumbrantes)