quarta-feira

Além.

Pois bem, tirei o dia para pensar hoje. Pensar no que eu quero, nas coisas que fiz, do que me arrependo, do que me trouxe dor e do que me trouxe luz. Natual, há dias que pensamos coisas deste gênero mesmo, mas hoje... hoje foi diferente.
Estranho como me parece tudo entalado na garganta, eu queria poder escrever tudo aqui, jogar as palavras para aliviar, não consigo, é tudo em vão. Todas as tentativas de esvaziar a alma foram em vão, desde o primeiro diário, aos nove anos. Eu ainda acredito que este primeiro diário estragou tudo e me fez escrever os outros, e não parar, e não conseguir parar. Hoje eu tenho sérias dificuldades de desabafar, dificilmente me sinto entendida, mas isso acontece, né?
Num desses pensamentos que me ocorreram, quando lia alguns fragmentos, veio-me um de Caio Fernando Abreu, como sempre me retirando as palavras da boca e me deixando de queixo caído... o fragmento dizia algo sobre pratos de doces e pessoas, e me fez sentir um prato de doce, que as pessoas adoram por um tempo, mas logo se enjoam, arde a garganta... eu sou assim, um grande prato de doce, sem dramas, sério, até porque isso não me afeta o quanto parece afetar, não afenta nem um terço.
Às vezes eu sinto uma necessidade maluca de solidão, o problema é que eu odeio estar sozinha, odeio ficar sozinha. Mas a solidão só é boa quando desejada... eu vivo me sentindo sozinha, ainda nos momentos em que não queria estar. É até injusto dizer assim, sendo que tenho tantos bons e leais amigos, aliás, não há como explicar, ficaria em piegas, então, pulem esta parte...
Pulem esta parte também, se quiserem... se acaso sintam necessidade, fechem o livro.
Eu não sei do que tenho necessidade, não sei do não gosto, não sei do que gosto. Pareço me conhecer tão bem mas, por vezes, me surpreendo com algo em mim que não conhecia. Não sei se gosto de me surpreender. Acho que não gosto, assim como não gosto de coisas "meio termo". Não gosto de meio sorriso, não gosto de meio abraço, meio azul meio verde, copo cheio até o meio, histórias que terminam ao meio. Não gosto de azul piscina por não ser nem azul nem verde. Tolero o cinza por algum motivo qe não conheço, mas me encomoda por não ser nem branco nem preto. Aliás, adoro branco. Mas voltando aos "meio termo", não gosto de meio sentimento, meio amor meio amizade, não sei porque, mas falta essência nessas coisas, entende? Parece um misto, uma salada sem tempero mas que parece bonitinho... não gosto. Mas gosto de quem canta doce, fala doce, ama doce... eu gosto de doce, deve ser por isso que sou um prato de doce... mas disso eu ja falei.
Hoje eu sinto uma vontade louca de sair andando, andando e andando... até parar em algum lugar, qualquer lugar... mentira, não gosto também de nada que seja qualquer, te que ser definido, definitivo. Eu queria o lugar que sonho desde que era criança, um lugar alto, com um balanço, muito verde e um solzinho fraco. Não, mas este lugar não existe e não consigo pensar em nenhum lugar mais concreto, em nada mais real. Eu amo o irreal, amo. Sempre me surpreendo quando descubro o real irreal ou sei lá, eu transformo irrealidades em realidades e quebro a cara, e choro. Essa é a hora em que as máscaras caem. Ah, tem uma coisa que eu conheço em mim... eu fantasio as pessoas, acho que elas são o que elas não são, isso para bom ou ruim.. para mim é ruim, como o filho da mãe do príncipe encantado, ele não existe, e eu adoro fantasiar e vestir os meninos de principes, depois.. ual, que maravilha, as máscaras caem.
Ah, me disseram um dia desses que eu tou pagando por tudo que fiz. Fiz alguns meninos sofrerem... era tão criança, eu. Agora me fazem sofrer, assim, sem hesitar. Eu tenho o péssimo hábito de não conseguir amar assim, de cara, quem gosta muito de mim... estranho não? Pois eu acho por demais estranho. E o pior de tudo é que sempre faço sofrer quem gosta de mim, arrumo alguma ferida para abrir e colocar sal. Pareço malvada? Pois isso é o que menos sou. O tal do sofrimento que provoco não é opcional, acontece, vem de mim. Eu queria ser até um pouco mais malvada do que sou, para as pessoas pararem de pisar, sapatear e afins em mim... eu queria ser um bocado de coisas que não sou. Queria ser forte, cantar bem, queria escrever bem também, queria conseguir dizer as palavras certas na hora certa, queria comer menos, queria correr mais. Queria comprar um relógio com um tempo só meu, parar, consertar, fazer isso quantas vezes sentisse vontade. Queria ganhar uma flor também, porque adoro flores, e a única pessoa que me deu algumas delas eu fiz a questão de fazer sofrer. Qual é a minha?
Concluí, nesses pensamentos bobos, confusos e desalinhados, que erro e, quando quero, acerto também. Concluí que um dia alguém vai me aceitar assim, meio pelas metades, meio temperamental, cheia de insônias e dores nas costas.Concluí também que não adianta procurar este alguém, ele vem até mim, quando estivermos preparados. Concluí que eu dou passos falsos mesmo, que eu ameaço cair, mas não caio porque odeio e tenho muito medo de escorregar. Concluí que, ainda que o meu quebra-cabeças falte muitas peças... pode ser que nunca fique completo, pode ser ora essa... mas eu sou humana, e humanos são insanos assim mesmo, cometem o que não querem cometer, vivem muitas vezes o que não querem viver, precisam de um bocado de coisas, precisam de abraço, precisam de carinho, precisam de atenção, de afago nos cabelos, de beijos nas bochechas, de elogios, de críticas, de aplausos, de amigos, de amores, de flores, de luares, de noitadas, de bebedeiras, de ressacas, de crises, de choros, de ombros para chorar. Eu descobri que não gosto de eterno também, porque soa falso. Não precisa dizer que algo será eterno, ele será se tiver de ser. Nem nós somos eternos, e olha que somos um bocado de coisas... somos humanos. Ser humano pode ser o pior defeito do ser. Não ser então... não há como não ser, nem como evitar. Só há como transformar tudo que é defeito em qualidade, ah, dane-se isso.
O bicho humano precisa de outro bicho humano para ser feliz, o bicho humano é incompleto, como eu sou. Eu pertenço à tribo dos humanos, seja isso bom ou ruim. Eu sou de carne, osso, e coração. Eu sou de alma, eu tenho alma, tenho as peças do jogo, as regras do jogo, mas erro, perco as pessoas, retorno ao zero. Faço isso um bocado de vezes, nunca aprendo, talvez nunca irei aprender. Eu sou feito você, sou bicho humano fora do zoológico, sou peixe fora d'agua.

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